Restauro no casarão do Vila de Vassouras mostra que, várias vezes, as grandes obras de arte estão nas pequenas peças
Por Rosa de Carvalho
Fotos Marcos Gusmão
Conforme as obras do Museu Vila de Vassouras avançam, as camadas de décadas de intervenção vão sendo desfeitas e a beleza dos detalhes vêm à tona. São eles que contam a história do casarão inaugurado em 1853, no alto da Praça Barão de Campo Belo, bem ao lado da Igreja da Matriz. São resquícios de épocas passadas, quando o prédio exercia outras funções: foi primeiro o hospital da Santa Casa de Misericórdia e, depois, o asilo Barão do Amparo. Em breve será o Museu Vila de Vssouras.
Esses pormenores são, por si só, verdadeiras obras de artes. Os beirais, claraboias e janelas contam um pouco sobre quem éramos e o que pensávamos em cada etapa, desde o século XIX. O museu será como uma máquina do tempo: uma viagem arquitetônica ao passado, mas com tecnologia e infraestrutura do futuro. É só assim que preservaremos nossa memória e projetaremos um futuro que integre a história e cultura de todas as gentes da região.
A fachada já se aproxima de sua forma final, mesmo que parcialmente escondida por equipamentos de obra. Começou a fase dos retoques, de resgatar as muitas camadas de história sobre cada pedra – das rezas às tradições, das virtudes aos desmandos, do tempo e da resiliência. Um museu feito de gente. De Manoel Congo e Mariana Crioula. De Clementina de Jesus a Benjamin Benatar. Dos coroados aos barões. De todos que – entre erros e acertos – construiram o Vale do Café.
O telhado do museu passou por um processo quase completo de restauro, após anos de abandono e um incêndio de grandes proporções em 2011 que o deixou em ruínas. Foi pensado para ser altamente resistente a intempéries e vedar a entrada de água. Sob as telas de cerâmica, de canal e francesas, há placas metálicas que garantem isolamento acústico e térmico.
Para quem vê, contudo, o telhado é idêntico ao trabalho histórico, seja em seu formato ou geometria. Logo abaixo dele, contrastando com o branco, há os detalhes da fachada original, que foram encobertos com o tempo.
— O que sobrou do telhado estava em péssimas condições, cupins, umidade, incêndio, apodrecimento, etc. Sendo o telhado a parte mais importante de uma edificação, o seu desempenho é ainda mais exigido em se tratando de um museu — disse o arquiteto Maurício Prochnik, responsável pelo projeto. Do lado externo utilizamos as mesmas telhas originais, com o mesmo desenho, caimento e alturas e, por dentro, a utilização de materiais atuais como estrutura metálica. O melhor teste foram as várias tempestades pelas quais passamos e não foi verificada nenhuma passagem de água.
As janelas e clarabóias, por sua vez, fazem a ponte entre o que está dentro e o que está fora: trazem a cidade para o museu e o levam para a cidade. Dão para a praça, para as laterais e para os fundos do museu, onde haverá uma área de convívio. As trocas serão constantes e ininterruptas, como ocorre quando entramos em contato com o que nos trouxe até aqui.
E são, de novo, os detalhes que fazem a diferença: as esquadrias das janelas, por exemplo, tiveram que ser refeitas por artesãos especializados. Tudo para garantir que ficassem idênticas ao seu projeto original.
— Já adiantamos boa parte dos restauros, mas ainda faltam alguns detalhes. Surgiu inclusive uma pintura interessante original na fachada principal que pretendemos refazer onde não existe mais — disse o arquiteto. — Mantivemos a função da clarabóia no telhado do prédio, mas o fizemos utilizando materiais diferentes e com tecnologia mais avançada como aço, perfis de alumínio e vidros.
Nada é tão importante quanto as portas, a ligação entre os dois mundos. O entra e sai, as idas e vindas. No Museu Vila de Vassouras, são grandes, pesadas e talhadas. O restauro agiu para que cada arte fosse mantida e destacasse a particularidade do trabalho do século XIX. Agora, o trabalho é para que fiquem na melhor forma possível, prontas para as boas-vindas.
O objetivo é que nunca estejam fechadas: o Vila de Vassouras é, antes de tudo, um museu sobre e para o Vale do Café. Ao cruzar as portas do casarão, o visitante estará em uma extensão não apenas de sua casa, mas também de si próprio.
A escada principal que dará acesso ao casarão é parte integrante do museu, uma peça valiosa em processo de restauro, com seus tijolos originais, centenários, na cor do barro. É um trabalho manual, mas cada pedacinho tem seu valor.
As lembranças, afinal, se misturam para formar a memória. E escavá-la é entrar em contato direto com o passado. Expõe traumas, mas também a essência de uma sociedade e as intervenções acumuladas que a moldaram e explicam porque somos o que somos.
As estruturas de ferro, por sua vez, são essenciais para dar sustentação a um prédio que, até poucos anos atrás, estava em ruína. Garantir uma estrutura forte e resistente é o primeiro passo para permanecer de pé por muito tempo e, com a tecnologia moderna, foi até possível identificar danos que datam da construção do prédio e agir para corrigi-los.
Já a fachada lateral é reforçada por uma construção moderna, em uma união do velho e do novo que é tão comum a cidades que preservam suas relíquias. Ainda falta um pouco para que fique pronta, mas sua arquitetura, com estrutura volumosa em concreto aparente, já dá o recado.
— É importante neste tipo de projeto deixar claro quais são as novas intervenções de construção, e decidimos adotar o concreto aparente como o principal material — disse Prochnik, afirmando que houve consultoria especializada para o processo. — Foram utilizadas formas de madeira para que ficasse a impressão do seu desenho no concreto. Fazer concreto aparente bonito e bem feito não é tão simples quanto possa parecer.
Na fachada central, enquanto isso, os tijolos originais são cobertos para que as paredes cheguem à sua forma final. Em pouco tempo, tudo isso – as portas, janelas, telhas, tijolos, muros, histórias e sonhos – estará aberto à visitação.
Gratidão por essa aula maravilhosa!!!! Parabéns a todos os envolvidos nesse belo trabalho!!!!
O Museu é um privilégio para nossa cidade! Acredito que sua inauguração marcará o início de uma nova era para Vassouras. Gratidão por compartilhar as informações, para que possamos acompanhar o trabalho. Parabéns à todos os envolvidos!