Em mais um episódio da série “Conversas”, o antropólogo Roberto DaMatta fala ao Museu Vila de Vassouras sobre identidade, elitismo, malandragem e um “Brasil do mais ou menos“
Por Renato Lemos
Antes que se visualize de fato o rosto de Roberto DaMatta na tela, o que primeiro chama a atenção no vídeo é a moldura que cerca o antropólogo: livros e livros dispostos de uma maneira completamente desordenada, pilhas de papel sobrepostos em prateleiras improvisadas, pastas pelo chão, uma espécie de biblioteca do caos. A imagem — uma desordem ordenada daquelas que só o dono é capaz de encontrar sentido — serve como senha para compreender o papel de DaMatta na antropologia e na cultura brasileiras: ele está aqui para tentar explicar a bagunça em que estamos enfiados há mais de quinhentos anos.
Autor de “Carnaval, Malandros e Heróis”, lançado em 1979, Roberto DaMatta subverteu o modo de ver o Brasil, olhando-o pelo avesso, expondo um país não-oficial, com seus tipos míticos, seus (anti) heróis de botequim, suas festas de prazer e fé. O livro, com sua abordagem de temáticas marginais, — que muitos encaram como um “Casa Grande e Senzala”, o clássico de Gilberto Freyre, visto das alcovas — é um divisor de águas na antropologia brasileira.
Em entrevista com as antropólogas Ilana Strozenberg e Maria Laura Cavalcante, o cientista social Valter Sinder e o jornalista Renato Lemos, Da Matta, que aos 86 anos mantém colunas semanais no Globo e no Estadão, esmiúça um Brasil que escapa do senso comum e das análises maniqueístas. Um país desenhado pela Igreja Católica e que, com todas as suas contradições, está “bem embaixo dos nossos narizes”.
“Aqui nada é sim ou não, nada é preto no branco, o Brasil é o país do mais ou menos”. É esse Brasil visto pelas frestas que surge em uma conversa que vai desde um diagnóstico sobre os males da política nacional (“O Brasil é um país extremamente autoritário e hierárquico”) a lembranças traumáticas de santos de carne, osso e cabelos da época do catecismo. Entre uma coisa e outra, DaMatta projeta ideias inovadoras para montagem de museus, relembra suas experiências com os indígenas e canta marchinhas carnavalescas à capela.
Malandragem, festa, inteligência, indignação, humor e paixão: sejam bem-vindos ao Brasil de Roberto DaMatta.
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